O aplicativo Bihua foi idealizado e desenvolvido pelo programador brasileiro Vitor Butkus. Ele tem bacharel e mestrado em Artes Visuais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Gratuito, o Bihua auxilia os usuários a praticar a caligrafia chinesa.
Butkus pesquisa a cultura chinesa há muito tempo. Estudou mandarim nos Institutos Confúcio na Unesp e na UFRGS. Ele também é especialista em Acupuntura pela ABACO e em Acupuntura Clínica Avançada pela Faculdade Ebramec. O tradutor chinês Wu Liang é parte da equipe que desenvolveu o Bihua. Ele e Vitor são amigos desde 2020.
Para usar o aplicativo clique AQUI. Saiba mais no Instagram do Bihua.
Em entrevista ao site do Ibrachina, Vitor Butkus fala sobre o projeto e a influência da cultura chinesa em sua vida.
Qual o objetivo do aplicativo?
Eu me interesso pela cultura chinesa há pelo menos 7 anos, e estudo mandarim desde 2020. No estudo do mandarim, alguns alunos costumam priorizar a fala. Vivemos em mundo com pressa de tudo, e a possibilidade de digitar um caractere na tela no celular através do pinyin acaba fazendo com que os estudantes deixem o aprendizado da escrita para depois.
Porém, no meu processo de estudo da língua, a escrita manual sempre teve um papel fundamental. Para isso, tive o estímulo dos meus professores no Instituto Confúcio. A professora Verena Veludo, do Instituto Confúcio na Unesp, sempre reforçou a importância de aprender a ordem correta dos traços e os elementos constitutivos dos caracteres, para ter uma compreensão mais profunda da língua e até mesmo da cultura chinesa. Por causa desse estímulo, eu comecei a praticar a escrita manual diariamente, prática que mantenho até hoje. Isso tem me ajudado muito nos estudos – junto, claro, a outros métodos.
Assim, o objetivo do Bihua é compartilhar com todos os estudantes esse estímulo que eu tive – além de colaborar para promover a integração do Brasil e da China através da língua.
O que motivou o surgimento do Bihua?
A ideia de criar o Bihua surgiu como um passatempo nas minhas horas vagas. Era um projeto pessoal que eu desenvolvia quando não estava trabalhando em sites e projetos para clientes. A motivação veio do meu próprio processo de estudo – onde a escrita manual sempre ocupou um lugar de prazer, meditação, disciplina e muito aprendizado.
O que impulsionou ainda mais o projeto foi o apoio e participação do tradutor chinês Wu Liang. Ele reside em Suzhou, na China e colabora muito com ideias e também orientações e revisão do conteúdo. Eu o conheci em 2020 e nunca nos vimos presencialmente. Mesmo assim, sempre falamos. Nossa amizade é fruto da mesma tecnologia que agora possibilita o surgimento do Bihua.
Entre meus motivos para desenvolver o app está a necessidade de suprir a demanda de uma ferramenta de estudo do mandarim em língua portuguesa e gratuita. A imensa maioria das ferramentas online, apps e livros didáticos de mandarim está em inglês. Isso acaba passando a ideia de que saber inglês é um pré-requisito para aprender mandarim – e não é. Então o Bihua também surge de uma vontade de democratizar o acesso ao mandarim: por ser em português e por ser de uso gratuito.
Hoje, o Bihua é uma ferramenta online de estudo e consulta de informações sobre os caracteres chineses. Ele tem uma série de funcionalidades, que inclui: praticar a escrita usando o mouse (no computador), o dedo (no celular) ou uma caneta digital (no tablet); praticar a escrita guiada, com dicas e correção dos traços; escutar a pronúncia em áudio; consultar listas temáticas de vocabulário. Ao digitar ou escolher um caractere, os usuários têm acesso às seguintes informações: definições em português ou inglês, transcrição fonética (pinyin), nível HSK ao qual o vocábulo pertence e versão em chinês tradicional.
Como tem sido a aceitação/feedback dos usuários?
A aceitação tem sido excelente. Eu comecei a mostrar o Bihua para professores, ex-professores e parceiros de estudo dois meses antes de lançá-lo publicamente. Absorvi os feedbacks desse grupo reduzido de amigos e parceiros e fiz diversas correções antes de, finalmente, lançá-lo em setembro de 2023. Hoje, mais de 90% dos nossos usuários acessam o site a partir do Brasil. Isso se deve ao fato de a nossa divulgação, feita principalmente no Instagram, ser ela também em português. É uma satisfação enorme ver que os estudantes estão fazendo uso do resultado de um projeto feito com tanto carinho – e que deu tanto trabalho também! Além de agradecimentos e elogios, também gostamos muito de receber sugestões da comunidade. Muitas dessas sugestões já foram incorporadas ao webapp, e estão sendo preparadas novas funcionalidades cuja prioridade é atender a esses pedidos.
A caligrafia chinesa é uma arte muito antiga, como o app dialoga com ela no mundo digital?
De fato, a escrita e a arte caligráfica chinesa são muito mais antigas do que os atuais dispositivos tecnológicos como o celular e o computador. E um dia, o próprio papel foi uma novidade técnica. A escrita chinesa é mais antiga do que a invenção do papel, que também foi inventado na China, por Cai Lun, no período Han Oriental.
Antes do papel, os chineses já escreveram em ossos, cascas de tartaruga, bambu, bronze e pedra. Eu acredito que a nossa civilização ainda vai continuar fazendo uso do papel por muito tempo – quem sabe séculos ainda. Mas, à medida que a tecnologia possibilita outras formas de escrita, não precisamos temer. É só olhar o exemplo dos antigos que, antes de nós, abraçaram “novas” tecnologias, como o papel. Vejo a escrita como a mãe de todas as técnicas: uma maravilhosa invenção que permanece e se transforma, à medida que os materiais usados para incorporá-la vão mudando. Para construir o atual recurso de escrita do Bihua, eu me inspirei nas canetas-gel (zhōngxìngbǐ), muito populares hoje em dia na China. Agora estou criando um recurso de “pincel”, que se assemelha ao efeito de um pincel de escrita tradicional (máobǐ). E também um recurso de impressão em PDF de listas de palavras. A ideia é criar um diálogo criativo e inovador entre o meio digital e o papel, entre as novas tecnologias pedagógicas e a milenar tradição da caligrafia.
Como você vê a popularização do mandarim e o interesse na cultura chinesa entre os brasileiros?
Acompanho o interesse crescente na cultura chinesa desde dentro desse movimento. Sempre fui fascinado pelo estudo de línguas, mas quando comecei a estudar mandarim foi amor à primeira vista. Vivo entre as cidades de Rio de Janeiro e São Paulo, e quando estou em São Paulo minha casa fica próxima ao bairro da Liberdade. Isso me fez criar amigos na comunidade de imigrantes, com quem troco aulas de português por aulas de mandarim. Mas a internet tem desempenhado um grande papel na popularização do mandarim e no interesse pela cultura chinesa.
As redes sociais tornam possível a divulgação do conhecimento na forma de conteúdos leves e acessíveis, e aos poucos o grande quebra-cabeça da cultura chinesa vai fazendo mais e mais sentido na mentalidade das pessoas. Jovens de todas as idades também estão incorporando na sua vida produções culturais contemporâneas chinesas, como a música pop e os c-dramas. É muito motivador ver como a tecnologia pode contribuir na promoção de uma integração cada vez mais profunda entre as culturas brasileira e chinesa. E me sinto muito feliz em fazer parte desse movimento.