O mandarim, língua oficial da China, é também a linguagem nativa mais falada do mundo, usada por mais de um bilhão de pessoas diariamente. Devido à importância crescente da China no cenário mundial, o interesse pelo seu aprendizado tem aumentado. Estima-se que atualmente mais de 25 milhões de pessoas estudam como segunda língua o “chinês”, como também é chamada.
No Brasil, os Institutos Confúcio são os principais propagadores da língua chinesa, oferecendo cursos e produzindo material de aprendizado. Neste 30 de setembro, Dia do Tradutor, o Ibrachina entrevistou a brasileira Verena Veludo sobre o aprendizado do mandarim e as oportunidades para tradutores.
Veludo é professora, tradutora e pesquisadora de língua, literatura e cultura chinesa. Graduada em Português e Chinês pela USP, morou na China, onde fez mestrado em Ensino de Chinês pela Universidade de Hubei.
Atualmente leciona no Instituto Confúcio na Unesp e já traduziu diversos livros do mandarim para o português, além de legendar filmes.
Confira a entrevista na íntegra:
Onde e como você aprendeu mandarim?
Em 2005, fiz um breve curso de chinês no Templo Zu Lai, antes de começar a graduação em Letras Chinês-Português na FFLCH-USP, onde definitivamente adquiri minha base da língua, cultura, literatura e história chinesa.
Tranquei a graduação para fazer intercâmbio na Universidade Normal de Yunnan por um semestre em 2009. Depois de graduada, em 2010, continuei meus estudos de língua e cultura chinesa no Instituto Confúcio na Unesp. Consegui uma bolsa de estudos do Instituto Confúcio para estudar chinês e fazer mestrado em Ensino Internacional de Chinês na Universidade de Hubei, Wuhan, onde vivi entre 2013-2016, tendo me aprofundado no ensino-aprendizagem da língua chinesa e vivenciado a cultura chinesa nos mais diversos aspectos.
Participo anualmente de treinamentos em metodologias de ensino de língua chinesa do Instituto Confúcio. Atualmente, faço mestrado no programa Letras Estrangeiras e Tradução (PPG-LETRA) na FFLCH-USP, desenvolvendo pesquisa e tradução de literatura chinesa contemporânea.
Existem alguns mitos no Brasil sobre a dificuldade de aprendizado de línguas orientais. Qual sua dica para quem deseja aprender?
A dica principal para quem deseja aprender línguas orientais como o chinês é criar um ambiente linguístico favorável ao aprendizado, e isso inclui fazer cursos, estudar conteúdos, fazer exercícios e praticar caracteres, ler livros, ouvir músicas, assistir a filmes, conversar com nativos ou colegas que também estudam o idioma, navegar na internet, usar aplicativos. Enfim, tudo o que seja possível fazer para entrar em contato com o idioma e dedicar-se ao seu aprendizado todos os dias.
Como é ser tradutor de mandarim para o português?
Comecei minha atividade formal como tradutora de chinês com o Mandarim Guia de Conversação da Lonely Planet, publicado pela Editora Globo, em 2013. Em 2016, publiquei pela editora Martins Fontes os livros “Chinês 30 dias” e “Cantonês Guia de Conversação da Berlitz”. A tradução desses livros enriqueceu meus estudos de língua chinesa por se tratar de materiais com vocabulário e frases da linguagem cotidiana que facilitam a comunicação, além de trazer algum vislumbre da cultura e costumes chineses.
Entre 2021 e 2022, traduzi cinco títulos da literatura infantil chinesa pela Editora Cai-Cai: “Eu sou Hua Mulan”, “A menina que amava as plantas”, “A Noite das Lanternas”, “Quem comeu minha castanha” e “Me empresta sua cauda?”.
Com essas traduções literárias, aprendi a fazer a leitura do original, e a pesquisa do autor e do contexto de escrita das obras; passei a trabalhar o entendimento ao nível dos vocábulos e suas relações internas dentro das orações e períodos, para captar seu sentido e transpô-lo em português. Especificamente no caso da tradução de literatura infantil, estou aprendendo a adaptar o texto à linguagem do universo da criança.
Realizei traduções de legenda de material audiovisual de filmes da Mostra de Cinema Chinês de São Paulo: “Mestres da Cidade Proibida” (2016) e “A Luz que contraria” (2017). Também legendei o filme “Um Lugar Perto da China” (2021) de Milena Moura, a série sobre ciências da China2Brazil, “Mundo dos Mistérios” e “Buscando a Natureza” (2021); e vídeos institucionais.
Esses trabalhos de tradução de legendas de materiais audiovisuais possibilitaram a expansão do meu vocabulário de chinês, as especificidades do trabalho de tradução de legendas e o conhecimento de ferramentas específicas para isso.
Também realizei trabalhos de tradução técnica de manuais, documentos, relatórios, notícias, e outros materiais diversos. Em algumas ocasiões fui tradutora-intérprete, fazendo acompanhamento de chineses no Brasil.
Além de literatura chinesa, que tem ganhado espaço, quais outros papéis o tradutor de mandarim pode desempenhar?
Para além da tradução da literatura chinesa é possível desempenhar papéis nas mais variadas áreas do conhecimento, fazendo a ponte entre a língua chinesa e portuguesa. Tradução e legendagem de materiais audiovisuais, como filmes, seriados, vídeos ou jogos. Também nas traduções escritas de livros de assuntos diversos, ou de documentos, relatórios, manuais, etc.. É possível ainda servir como tradutor-intérprete em reuniões, eventos, congressos de instituições públicas e privadas, além de órgãos governamentais.
Há um interesse crescente pela língua, devido à importância da China no cenário geopolítico atual. Mesmo assim, no Brasil ela não é tão popular. Como você vê o mercado para a tradução?
Eu vejo o mercado da tradução de chinês no Brasil bastante aquecido, embora a língua não seja tão popular ainda no nosso país. Há uma grande demanda por tradutores-intérpretes principalmente na área comercial, em razão das relações estabelecidas entre a China e o Brasil.
Com o crescente interesse dos brasileiros pelo aprendizado da língua e pelo conhecimento geral da cultura, história, literatura da China, existe também uma demanda por traduções de materiais didáticos, paradidáticos e outros materiais de apoio. Para termos bons profissionais da tradução chinês-português, capazes de atender as demandas e atuar nas mais diversas áreas, é necessário investir em sua formação integral, oferecendo acesso a bons materiais, cursos, treinamentos, etc. Neste quesito acho que ainda estamos carentes de qualificação.