* Por Rodrigo Moura

Foi em 2020 que a China anunciou a erradicação da extrema pobreza em seu território. Contudo, essa boa notícia foi encoberta pela pandemia do coronavírus que se espalhou pelo mundo no mesmo ano. Com o intuito de avançar ainda mais na erradicação da pobreza, também buscando inculcar o sentimento de cidadania em seus alunos, algumas Universidades, dentre elas a de Zhejiang, organizam todos os anos missões de alunos, pesquisadores e professores para as regiões mais pobres do país. O objetivo é que eles testemunhem o progresso alcançado, além de observarem as condições do lugar e a sustentabilidade dos avanços, ajudando no que for preciso e possível.

Meu nome é Rodrigo Moura, sou Diretor de Relações Internacionais do Ibrachina e aluno da Universidade de Zhejiang. Tive a oportunidade de participar em um desses grupos que são conhecidos pela Política Nacional de Alívio a Pobreza como “avaliadores terceiros”. Em 20 de junho de 2021, parti de Hangzhou com um grupo do qual faziam parte alunos de Doutorado, Mestrado e Bacharelado e dos mais diversos cursos, incluindo alunos chineses e um indonésio. Eu era o único brasileiro.

O destino foi Jingdong e a viagem para aquela região é muito longa. São cerca de três horas de avião de Hangzhou a Kunming, capital da província de Yunnan. De Kunming até Puer, mais sete horas de carro, isso graças a recém-construída estrada de alta velocidade. Por fim, outras três horas de carro por estrada de terra até Jingdong.

Depois de um dia inteiro de viagem nos reunimos em Puer. No dia 21 de junho, o professor Xu Yazhou, um comissário local, apresentou o histórico das comunidades e suas necessidades. Puer fica no sul da província de Yunnan, na parte inferior do grande rio Mekong. A área montanhosa ocupa 98% de seu território com alturas que alcançam até 3.306 metros acima do nível do mar. Uma realidade desafiadora para os seus mais de 2,5 milhões de habitantes, que estão espalhados por suas unidades administrativas.

Nessa missão o foco foi Jingdong, área que conseguiu vencer a extrema pobreza. Recentemente 110 aldeias passaram por uma grande mudança, com os índices de extrema pobreza diminuindo de 22,34% em 2014, caindo para 1,31% em 2019, e chegando a zero em 2020.

Primeiro, é importante entendermos o que é extrema pobreza. Na China estão incluídos nessa categoria todos aqueles que sobrevivem com menos de 2,30 dólares por dia e não têm acesso a saúde e educação. Vale relembrar que a população em situação de extrema pobreza era de quase 90% em 1978. Essa porcentagem foi diminuindo para algo entre 1 e 2% em 2018, sendo zerada em 2020. Ou seja, em 40 anos podemos afirmar que um milagre aconteceu na China: mais de 700 milhões de pessoas deixaram a pobreza extrema e hoje possuem o mínimo para sobreviver.

Cabe ainda distinguir que há uma discussão em torno do índice correto a ser utilizado para calcular a redução da pobreza na China. O Banco Mundial fixou o valor 1,90 dólares por dia, mas recomenda que se use o valor entre 3,20 e 5,50 dólares por dia como referência para avaliar a pobreza em países de renda-média baixa e renda-média alta, respectivamente.
No entanto, o Governo chinês definiu o valor de 355 dólares por ano, o equivalente a a 0.97 por dia, alegando que este valor se adequa à realidade chinesa. Quando ajustado, deve levar em conta as diferenças de preços entre o meio rural-urbano. Com isso, 2,30 dólares ficou estabelecido como a linha oficial de pobreza rural na China. O debate está em qual valor é utilizado para fazer os cálculos e se a China é, ou não, um país de renda-média alta. Porém, não importa qual a referência utilizada, pois é inegável que a pobreza reduziu radicalmente.

Esse objetivo só foi alcançado porque o governo central definiu a redução da pobreza como prioridade. Para ter êxito, utilizou diversas medidas diretas e indiretas. Isso inclui a ajuda de pesquisadores que focaram em entender cada localidade, bem como os governos locais, que estudaram as necessidades específicas de cada região. Além disso, servidores públicos foram enviados pelo governo central para implementar e monitorar planos de ação, com o intuito de impulsionar o combate à pobreza. Podemos concluir que não há uma receita única para enfrentar o problema, uma vez que cada região agiu de acordo com a sua realidade e suas possibilidades. No próximo artigo vou apresentar algumas destas estratégias.

* Rodrigo Moura é Diretor de Relações Internacionais do Ibrachina e aluno da Universidade de Zhejiang, na China.

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