As medidas de controle implementadas na China reduziram drasticamente a disseminação do coronavírus. Esta é a conclusão de um estudo internacional divulgado na última quarta-feira (25/3) pela revista Science. O relatório é assinado por cientistas de alguns dos principais centros de pesquisa do mundo, como Universidade de Oxford, no Reino Unido, Universidade de Harvard, nos EUA, e Instituto Pasteur, na França.
Prova do sucesso da estratégia chinesa é o fim do isolamento anunciado pela província de Hubei. A cidade de Wuhan, primeiro epicentro do surto da COVID-19 no mundo, já não apresenta mais casos de transmissão local. Seus cidadãos poderão voltar às suas rotinas a partir de 8 de abril. O caso da China inspirou outros países que também estão conseguindo bons resultados no combate à pandemia. Conheça algumas das medidas que estão sendo adotadas com eficácia:
CHINA
Isolamento imediato do epicentro da doença
Assim que foi constatado o surto do coronavírus, a cidade de Wuhan, que fica na província de Hubei, foi isolada antes que os casos de infecção atingissem o pico, ocorrido na segunda quinzena de fevereiro. A metrópole de 11 milhões de habitantes foi completamente fechada pelas autoridades chinesas.
Suspensão imediata das atividades acadêmicas
Antes mesmo dos casos de coronavírus atingirem patamares alarmantes, escolas, cursos e universidades suspenderam as aulas. Houve muito questionamento a respeito do quanto isso afetaria o ano letivo de crianças e universitários a longo prazo mas, cerca de 20 dias após suspensão anunciada pelo Ministério da Educação, a grande maioria das instituições retomou o andamento das atividades via plataformas de ensino online.
Ampliação dos serviços de testagem de pessoas
O governo chinês investiu na produção de testes rápidos para detecção do coronavírus. Com os resultados, puderam agir imediatamente no isolamento dos casos suspeitos, dos casos confirmados e das pessoas que tiveram contato com eles. A Organização Mundial da Saúde – OMS e especialistas concordam que a detecção precoce de casos é um fator fundamental para conter a disseminação de um vírus. “Você não pode agir ou saber o real impacto do vírus sem saber quantas pessoas ele afetou”.
Construção de hospitais de campanha
Prevendo um colapso no sistema de saúde por causa da epidemia, o governo chinês construiu quase 20 hospitais temporários para atender todos os pacientes, desde os que estavam apenas com suspeitas aos que já apresentavam sintomas graves da doença. O primeiro deles foi erguido em apenas 10 dias na cidade de Wuhan, surpreendendo o mundo inteiro. Isso foi possível através do uso de construções pré-fabricadas – a estratégia é a mesma que a China usou para conter a crise do vírus da SARS, em 2003.
Quarentena geral e pessoal
A China estipulou regras rigorosas para o cumprimento da quarentena desde o início do surto da COVID-19. Aqueles considerados em zona de alto risco, ou imigrantes e cidadãos advindos de locais com um possível contato, são diariamente monitorados. Para os casos mais graves, o redirecionamento é para um hotel estipulado pelas autoridades, onde um isolamento completo de 14 dias é requerido. Aos que não apresentam risco, é recomendada a quarentena pessoal, também de duas semanas. Em alguns casos, os próprios seguranças dos condomínios e prédios controlam o cumprimento desse período.
Controle rigoroso de voos internacionais nos aeroportos de entrada do país
O monitoramento daqueles que estiveram fora do país só foi possível graças a extrema organização nos principais aeroportos da China. Agentes checam temperaturas dentro dos voos que chegam e acabam atrasando o desembarque das aeronaves. Todos os passageiros, nacionais ou não, precisam preencher dados e atestados de saúde e entregá-los na imigração. Os passaportes são triados por cor, com adesivos que indicam a proveniência do passageiro de acordo com o nível de riscos de contágio.
Suspensão de serviços de transportes pessoais
Os serviços de táxi e de aplicativos de transporte restringiram suas opções para os poucos habitantes que ainda precisaram se locomover diariamente. O número de motoristas disponíveis diminuiu e aqueles que optaram por continuar trabalhando, reforçaram os itens de higiene pessoal disponíveis para os passageiros.
Proibição da entrada de visitantes em conjuntos habitacionais
Os seguranças e porteiros responsáveis pelo controle de acesso em condomínios e vilas habitacionais foram orientados a não autorizar nenhuma pessoa de fora a adentrar as imediações. Assinaturas e checagem de temperatura são necessárias para moradores registrados a cada deslocamento.
Desinfecção de ruas
Duas vezes por dia, agentes de limpeza saem para lavar as ruas da China com produtos desinfetantes. Garantir a limpeza e a higiene das ruas se mostrou uma ótima estratégia para garantir o ir e vir de quem não tem a opção de se manter em casa. Os profissionais ganharam o reforço de drones que borrifam o produto em determinadas áreas. Todo o trabalho de desinfecção utiliza o quaternário de amônia de 5ª geração, que age como uma película que mata os micro-organismos que estão no local (vírus, bactérias, fungos e ácaros) e forma uma camada protetora que mantém o local desinfetado.
Suspensão ou redução dos serviços de entrega
Entregadores de comida e encomendas também tiveram suas entradas negadas em condomínios. A orientação é que os moradores busquem seus pedidos na rua e sempre confiram a temperatura ao retornar.
Uso de máscaras
Os chineses levaram o uso de máscaras de proteção muito a sério desde o início. Não se vê uma pessoa na rua que não esteja usando máscara. Os estoques se esgotaram rapidamente e a China aceitou doação de outros países para suprir a necessidade do mercado.
Checagem de temperatura em todos os estabelecimentos públicos
Aos poucos serviços que se mantiveram ativos durante os últimos dois meses, um termômetro foi colocado e disponibilizado na entrada. Na maioria deles a checagem é obrigatória.
Desenvolvimento de novos sistemas de controle via WeChat
Dentro da rede social mais usada na China, o WeChat, foi criada uma opção que facilita o controle e monitoramento dos casos da doença. Além de um mapa guiado por vizinhança e/ou arredores que indicam locais onde foram registrados casos, a plataforma também disponibilizou o “código antivírus” que possibilita aos usuários cadastrar informações e atestados de saúde, gerando um código aqueles que estão livres do vírus para que sejam facilmente identificados.
COREIA DO SUL
O país tornou-se em fevereiro o segundo maior foco da doença no mundo, ficando atrás somente da China. Acredita-se que o início da epidemia foi o culto religioso Shincheonji, uma seita sul-coreana de influência neopentecostal com mais de 215 mil seguidores. Uma integrante foi infectada e acabou sendo responsável por dois terços dos casos no país. Sua congregação compartilhava locais fechados, com pouco espaço para circulação, além de punições severas para ausências nos cultos mesmo em caso de sintomas de doença.
Isolamento domiciliar e testagem emergencial
Quando somava apenas 50 casos, o prefeito de Daegu – a cidade do primeiro foco, falou de uma “crise sem precedentes” e pediu a todos os cidadãos que ficassem em suas casas e usassem máscaras a todo momento. Esse aviso do prefeito sul-coreano chegou em 20 de fevereiro, quando foi descoberto que o vírus se estava se propagando em uma seita religiosa. No dia seguinte e o dobro de casos, o primeiro-ministro coreano qualificou a situação de “urgente”, e dois dias depois “do mais alto alarme”. O governo decidiu realizar testes em qualquer um que tiver estado em contato direto com casos confirmados. Em lugar de esperar que os pacientes comparecessem aos postos, agentes foram até eles para procurar possíveis infectados e evitar que contagiassem a comunidade.
Serviço de informações do governo
O governo sul coreano possui um serviço de mensagens de emergência. Em geral, informam infecções recentes do COVID-19 de acordo com o bairro de residência de cada cidadão. Trazem também um link onde é possível visualizar a trajetória dos novos pacientes pela cidade. Com a ajuda de dados de geolocalização dos celulares, mostram por onde cada novo infectado andou, as linhas de metrô que tomou, onde almoçou, por quais ruas transitou até o momento da confirmação da infecção. Ao informar a trajetória dos infectados, o governo consegue avisar quem pode ter passado nos mesmos lugares e contraído o vírus. Como incentiva até mesmo quem não tem sintomas a usar máscara, consegue diminuir a disseminação.
Drive-thru de testes
A corrida aos hospitais e postos de saúde chineses atrás de testes para coronavírus aumentou o número de pessoas infectadas por causa das aglomerações. Para evitar o problema, a Coreia do Sul desenvolveu o sistema de drive-thru. As pessoas podem realizar o teste para o vírus de dentro de seus carros, o que reduz o risco de infecção. Os testes se transformaram em exemplo de boas práticas no restante do país e no mundo – o presidente americano Donald Trump gostou tanto da ideia que prometeu colocá-la em prática nos Estados Unidos nas próximas semanas. Para incentivar a participação de todos, os testes são gratuitos para qualquer pessoa encaminhada por um médico ou com sintomas após contato recente com um caso confirmado ou depois de retornar de viagem. Estima-se que o país realize mais de 15 mil exames diários.
Redução da jornada de trabalho e home-office
De forma voluntária, empresas grandes e pequenas estão não apenas cancelaram grandes reuniões e eventos, mas também incentivando o home office, antes encarado como uma utopia estrangeira.
Políticas restritivas para viajantes
Os sul-coreanos introduziram apenas “procedimentos especiais de imigração” para países fortemente afetados, como a China, exigindo que os viajantes passem por verificações de temperatura, forneçam informações de contato e preencham questionários de saúde. “Rastrear, testar e tratar” tem sido o mantra dos agentes públicos de saúde do país até o momento.
Hábitos culturais diferentes dos ocidentais
Os sul-coreanos têm um senso de coletividade pouco comum no Ocidente. Isso explica o hábito de usar máscara protetivas, a familiaridade com práticas de distanciamento social e a divulgação de dados sobre a trajetória dos infectados. Os detalhados mapeamentos de contaminados não teriam sido obtidos e divulgados de modo tão rápido sem o uso extensivo de câmeras de vigilância e acesso a informações privadas como transações de cartão de crédito e geolocalização de smartphones — medidas que ganharam apoio legal após o surto de Mers de 2015. Apesar do sucesso da estratégia sul coreana, especialistas têm dúvidas sobre até que ponto esse modelo pode ser “exportado” devido a essas características.
JAPÃO
Elogiado pelo sucesso em combater o coronavírus, o Japão não teve nenhum dia com mais de 60 novos casos. Apesar de o primeiro caso ter sido registrado em janeiro, o país possui pouco mais de 1.300 casos. Uma explicação para que o Japão tenha tomado medidas menos drásticas contra a COVID-19 pode ser cultural. Entretanto, assim como em diversos outros países, o governo japonês não testa todas as pessoas, somente os pacientes que os médicos julgam necessário, com especial atenção para quem tem quadro de pneumonia. O governo pede que “pacientes com sintomas leves de gripe fiquem em casa”. Essa medida pode levar ao quadro de subnotificações e interferir no número real de casos, de acordo com especialistas.
Distanciamento social
Depois dos alertas do governo japonês sobre a nova pandemia, a população reforçou seus hábitos restritivos e a etiqueta de higiene. Japoneses estão acostumados a usar máscaras quando estão gripados, então incorporar o uso ao cotidiano foi fácil. Também costumam manter certa distância de outras pessoas e cumprimentar sem tocar, ao contrário do que fazem os ocidentais. Culturalmente, japoneses também entendem que não devem causar problemas ao outro.
Proibição de aglomerações
Foram barrados em eventos que atraiam muitas pessoas, medida que afetou principalmente as áreas área cultural e esportiva. As aulas também foram suspensas em unidades de ensino. O governo de Tóquio, pede (mas não exige) que as pessoas fiquem em suas casas, e espera que as pessoas se isolem em casa voluntariamente.
Isolamento de viajantes
A medida mais incisiva tomada pelo governo japonês diz respeito a viagens ao exterior. Há isolamento para seus cidadãos que chegam de países em que há os piores cenários do novo coronavírus, como Estados Unidos, China e nações europeias. Estrangeiros que estiveram nessas localidades são impedidos de entrar no país.
Abaixo, traçamos um comparativo de estratégias adotadas em outros países:
Fontes: Revista Época, Jovem Pan, BBC e GaúchaZH