Para vencer a pobreza, a China utilizou alguns recursos de maneira simultânea e, em outros momentos, em tempos diferentes. Entre eles, podemos citar os incentivos à indústria, a realocação dos habitantes, a compensação ecológica, o reforço na educação e a expansão da seguridade social.
No caso de Jingdong, onde fui como um dos observadores, percebemos que o governo implantou a política de estímulo à indústria local. Primeiro, conectou-a com a cadeia de produção regional e, posteriormente, à nacional, por meio de obras de infraestrutura como estradas e trem-bala com conexão direta para a capital, Kunming. Também investiu na qualificação dos profissionais e dos processos industriais para atender aos padrões nacionais e internacionais. A expansão do e-commerce foi uma das ferramentas para ampliar o acesso aos mercados.
Tornou-se necessária a realocação dos habitantes, visto que algumas comunidades viviam em áreas de risco e difícil acesso. Nesses casos foram construídas novas moradias, medindo cerca de 80 metros quadrados, e com mobília básica incluída (camas, sofá, geladeira, fogão e mesa). Cada família paga no máximo 10.000 yuans por habitação, equivalente a 8 mil reais, mesmo que a casa valha muito mais, por volta de 200.000 yuans (R$ 160 mil). O subsídio governamental é uma forma de incentivo. Além disso, essas novas moradias foram construídas próximas à estrada e às novas estações recém construídas. É importante ressaltar que as mudanças não foram forçadas, mas acompanhadas de diversos incentivos. Os que decidiram não se mudar, continuaram morando na antiga vila.
Quanto à compensação ecológica, a resposta do governo contra a degradação ambiental é uma visão de futuro global. Busca alcançar a “Civilização Ecológica Socialista Chinesa”. Como disse o presidente Xi Jinping: “o Covid-19 nos lembra que a humanidade deve buscar alcançar a revolução verde”.
A China já prevê compensações como ferramenta de preservação do meio ambiente por meio do pagamento por serviços ambientais. Na área de Jingdong, isso é utilizado nas regiões próximas ao rio Mekong, visando proteger aquela bacia hidrográfica.
No caso do reforço na educação, Jingdong teve muitos avanços. Suas escolas são bem administradas, possuem aparelhos e ferramentas em bom estado, oferecendo uma excelente conexão com a internet. Os professores são bem dispostos e engajados. Os alunos são disciplinados e estudiosos, muitos deles com notas altas, conforme reportaram orgulhosamente seus professores. Contudo, existe um descompasso entre a educação formal oferecida no campo e o ensino da cidade. O desequilíbrio é latente, levantando questões sobre justiça social e meritocracia. No entanto, a sede por conhecimento e a disciplina nos estudos está incorporada nos dois lugares de tal forma que os alunos, por mais jovens que sejam, sabem que a educação é um meio possível de ascensão social. Também entendem que é o meio de concretizar seu desejo de ser professor, médico, cientista, soldado ou exercer outras profissões.
Isso foi o que mais me tocou: ver alunos muito pobres de áreas distantes cheios de sonhos e curiosidades sobre o mundo. Com esses projetos do governo, passaram a ter a possibilidade de concretizar seus sonhos. O mais impressionante foram os professores, em sua maioria mulheres, que nos receberam com alegria e muita vontade de aprender. Essa foi uma lição importante, pois elas eram mais experientes e capazes do que eu. Mesmo assim, pediram por orientações e possíveis sugestões de melhorias em seus métodos de ensino.
Por fim, o recurso da seguridade social, que ainda carece de atendimento pleno em Jingdong, principalmente para idosos e portadores de deficiência. Na China há uma frequente discussão sobre a diferença entre a seguridade do campo e dos centros urbanos. Chamou a atenção ver os idosos cuidando dos netos e ajudando no desenvolvimento da cidade. Sabidamente, a imigração dos jovens com idades entre 18 e 35 anos é alta e muitos deixam seus filhos para trás. Isso obviamente cria dificuldades para o município, como a saúde psicológica das crianças e o desequilíbrio demográfico que impacta o mercado de trabalho local.
Claramente, este problema ainda não foi resolvido. Como dizem na China, este foi um pequeno objetivo atingido, mas agora é necessário assegurar que esse desenvolvimento seja sustentável e duradouro. O que a China conquistou foi a erradicação da extrema pobreza e não de toda forma de pobreza, que continua a existir. Para o governo, mesmo que se tenha eliminado o rótulo de “extrema pobreza”, ainda é necessário manter o foco na responsabilidade de manter o resultado alcançado, reforçar as políticas públicas que deram certo, demonstrar empatia para com as vítimas da pobreza e manter uma supervisão contínua.
Os grupos de “avaliadores terceiros” fazem parte do trabalho de supervisão contínua. E este é o tema do terceiro artigo desta série que será publicado no site do Ibrachina. Acompanhe.
Você pode ler o primeiro da série aqui.